quinta-feira, 6 de maio de 2010

HISTÓRIA ► U.S.S. Maine: outro capítulo do duelo entre a História como ela é e a história que os governos gostam de contar

Praticamente por acaso, tive chance de assistir neste fim de semana a mais um programa da ótima série “Reescrevendo a História”, do canal por assinatura Discovery Civilization, canal 86 da Net. Desta vez, o programa investigava a explosão do encouraçado da marinha norte-americana U.S.S. Maine, ocorrida em fevereiro de 1898 nas águas de Havana, em Cuba.

Na época, a ilha cubana lutava contra o domínio espanhol e os norte-americanos, claro, preocupavam-se em defender seus interesses e seus cidadãos naquela ilha – lembra alguma(s) história(s) recente(s)?

Para lá, então, foi enviado o U.S.S. Maine, uma nave de guerra de grande porte para aqueles tempos, construída numa leva que resultara de pressões sofridas pelo governo dos EUA, muito criticado pela inferioridade naval do país em relação a outras potências.

O Maine chegou a águas cubanas em janeiro daquele ano e em 15 fevereiro uma grande explosão afundou o navio, matando 260 de seus marinheiros.

A princípio, os americanos em Havana não informaram ao país a causa da explosão, o que gerou muita especulação. A principal delas, que o Maine fora vítima de uma mina espanhola propositalmente armada para minar (mina usada para minar, faz todo sentido...) a influência norte-americana na questão Cuba-Espanha.

Para o governo dos EUA, era muito mais simples abraçar essa versão do que aceitar que a tragédia pudesse ter ocorrido por falha de construção, até porque havia nos mares outros barcos da mesma família do Maine.

E essa “ação espanhola”, seguida de um histérico clamor por vingança, teria sido um dos estopins da Guerra Hispano-Americana, que resultou no controle norte-americano sobre as colônias espanholas no Mar do Caribe e no Oceano Pacífico. Na foto, reprodução da capa do New York Journal de 17 de janeiro de 1898, acusando explicitamente os espanhóis pelo afundamento do navio.

Pouco mais de uma década depois, uma comissão foi nomeada pelo senado norte-americano para apurar a verdadeira causa da explosão que destruiu o Maine. Essa comissão deixou registros muito importantes para a História, principalmente registros fotográficos dos destroços, o que viria a ser fundamental para futuras investigações sobre o caso.

Mas, muito pressionada pelo governo, que não queria admitir que um de seus pretextos para ir àquela guerra fora uma trágica farsa, a comissão acabou apenas corroborando a versão oficial de que o navio foi vítima de uma mina espanhola.

No início dos anos 1970, nova investigação foi feita, mas, apesar dos avanços e das desconfianças, não obteve indícios conclusivos de que a história não ocorrera exatamente como fora contada.

Um século depois da explosão do Maine, porém, munidos de recursos computadorizados e das antigas fotografias, engenheiros realizaram uma verdadeira autópsia forense dos destroços, descobrindo que seria impossível o navio ter sido vítima de uma mina. E mais: uma falha em sua construção teria sido a causa do acidente.

Infelizmente para a História, apesar de todos os indícios e resultados apresentados, o governo norte-americano refuta a nova – e verdadeira - versão da tragédia do Maine, alegando não haver provas físicas evidentes de que ocorrera o que os modernos investigadores descobriram.

Uma pena que a tragédia do U.S.S. Maine até hoje seja usada pelos EUA como peça de manobra política e que o país não permita que a verdade seja oficialmente sacramentada, o que seria o mínimo a fazer em nome daquelas 260 vítimas fatais e da própria verdade.

Bem, foi o que entendi de um navio de guerra do qual muito já tinha ouvido falar, mas sem fazer real ideia do que ocorrera com ele. Quem quiser saber mais sobre a história completa dessa investigação deve ficar de olho em eventuais reprises no Discovery Civilization - ou então sair dando “googleadas” pela internet.

Mas lembre-se: cuidado com as páginas onde for cair. A história contada ali pode ser assim, com H minúsculo, e não a História como ela realmente aconteceu, com H maiúsculo.

Um comentário:

robertapaiva disse...

David,
adoro os seus textos!
Poxa! você tem que escrever um livro com as suas crônicas e artigos!
Seremos os primeiros na fila de autógrafos ao lado da Fernanda rs!
Parabéns por esse "lar da escrita" tão interessante:)
beijo!
Beta Paiva