terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

FUTEBOL ► Paradinha era o que Pelé fazia, o que fazem hoje é presepada mesmo

O clássico de domingo passado entre Santos x São Paulo abriu uma nova rodada de discussões sobre a chamada paradinha, artifício que alguns jogadores usam na hora de cobrar um pênalti. No tal jogo, Robinho marcou para o Santos assim, gerando críticas do goleiro são-paulino Rogério Ceni - ele que já converteu pênaltis cobrando da mesma forma. Poderíamos dizer que o esporte, como a vida, é assim: um dia da caça, outro do caçador...

Mas voltando à paradinha propriamente dita, paradinha era o que Pelé fazia. Corria para a bola, dava uma ligeira travada e trocava de pé ainda em movimento, ganhando tempo para perceber para que lado o goleiro cairia e deslocá-lo. Não era algo simples de fazer, era preciso técnica. Tanto que hoje praticamente ninguém cobra pênaltis assim. Não me recordo de nenhuma cobrança mais ou menos recente sendo feita dessa forma.

O que esses Robinhos, Freds e muitos outros jogadores fazem hoje não passa de uma presepada antiesportiva que fere totalmente o espírito de qualquer esporte, já que é apenas uma trapaça para ludibriar o adversário.

E vejam que é uma trapaça tão boba quanto infantil. Tanto não requer maiores fundamentos que qualquer criança faz a mesma coisa brincando de jogar bola, fingindo chutar e passando o pé por cima, não é mesmo? Não é preciso categoria alguma para isso. No caso das crianças, é uma infantilidade própria da idade e do prazer de brincar, algo que até os mais velhos fazem quando estão se divertindo com os filhos ou amigos. Mas no futebol dito profissional, é apenas malandragem no pior sentido – como se houvesse algum bom sentido em ser malandro.

Já no tempo do Rei, os árbitros questionavam a esportividade da sua paradinha. Acreditem: algumas vezes mandavam voltar a cobrança. O que dizer da palhaçada que é feita hoje, então? É algo que simplesmente tira a moral da partida, põe em xeque a credibilidade do próprio futebol: em vez de esporte associado (conforme definição da própria Fifa), passa a ser esporte de moleques. Como se já não bastassem coisas ainda piores que rondam esse esporte dentro e fora de campo...

A Fifa fala, fala, fala, chia, ameaça, esperneia, diz que não quer, não pode, não deve, é ilegal, é imoral e engorda... mas não proíbe oficialmente essa calhordice. Até lá, continuaremos a assistir no futebol profissional, que cobra cada vez mais caro por um ingresso, falsos malandros protagonizarem cenas que seriam melhor apreciadas, gratuitamente, em qualquer campo de pelada ou no quintal de nossas próprias casas, regadas a cerveja ou refrigerante.

Se é para bagunçar, melhor que seja assim logo:

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

CINEMA ► "2012" é o fim do mundo (ou como desperdicei duas horas e meia de minha vida sem fazer força)

Domingo de sol, mais de 40 graus do lado de fora, decido passar tempo assistindo finalmente a "2012", o mais recente filme apocalíptico de Roland Emmerich.

Pouco mais de duas horas e meia depois, minha esposa me encontra irritado e com dor de cabeça. "Mas o que você esperava de um filme desses?", ela perguntou.

Tá bom, eu sei que minha formação cinematográfica - se é que exista isso - passa mais por François Truffaut, Ettore Scola, Wim Wenders, Woody Allen e afins, os muitas vezes pejorativamente chamados de "filmes cabeça". Mas também gosto de geniais diretores de filmes que arrebentam na bilheteria, como Steven "quase-tudo-que-toca-vira-ouro" Spielberg e Francis "O Poderoso Chefão" Coppola. Fora que sempre fui grande fã de ficção científica.

E aí meu ecletismo cinematográfico se amplia: comédias idiotas, filmes despretensiosamente horríveis e filmes catástrofes sem cabeça alguma, mas com impressionante visual...

Então eu respondi: "Nada demais, só aquelas cenas espetaculares que ele mesmo (o diretor) fez em "Independence Day" e em "O Dia Depois de Amanhã", com um mínimo de inteligência no roteiro para que eu não seja chamado de burro."

E é aí que a porca torce o rabo: perto de "2012", "Independence Day" e "O Dia Depois de Amanhã" são verdadeiras obras-primas, como "Cidadão Kane" ou "Casablanca". Uma coisa é fazer um filme catástrofe sem cabeça, caprichando nos efeitos, com cenas de tirar o fôlego e deixar de boca aberta. Outra é fazer um filme sem cabeça, tronco e membros e que abusa - como poucas vezes vi no cinema - do direito de deixar o espectador ter a certeza do que vai acontecer na cena seguinte ou na sequência de uma mesma cena. Irritante! Não há efeito especial que dê jeito nisso.

Numa escala de 1 a 10, daria nota 2: 1 pelos efeitos e 1 pela presença de atores como John Cusack e Oliver Platt no elenco. Mas que diabos fazem atores como John Cusack e Oliver Platt em uma catástrofe como "2012"?

E o pior é que a história em que se baseia o filme é bem interessante e permitiria um roteiro minimamente inteligente e com alguma veracidade. Mas o diretor parece ter optado por apenas divertir-se torrando 200 milhões de dólares em efeitos espetaculares, gastando de repente uns trocados do bolso em um roteiro absolutamente inverossímil, já que praticamente nada explica e tudo apenas acontece.

Mas deve ter dado certo, já que arrecadou mais que o triplo do que gastou. Só que tenho a certeza que o povo que ainda vai ver esse filme o faz bem acompanhado, no ar condicionado, comendo pipoca e tomando refrigerante. E eu aturei essa bomba sem ar, pipoca e companhia. Pelo menos não levei ninguém para o mau caminho.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

CARNAVAL ► Vestir uma camisa listrada e sair cantando por aí no carnaval pode fazer mal ao bolso

Boa matéria publicada na “Revista de Domingo”, encarte de 31 de janeiro do jornal O Globo, com o título “Com o cadastro da prefeitura em mãos, o Ecad aperta o cerco aos blocos”. Quem puder, vale a leitura.

Responsável pela arrecadação e distribuição de direitos autorais de músicas e de posse do cadastro na prefeitura dos blocos de rua que desfilarão este ano no Rio de Janeiro, o Ecad quer multar os organizadores que não pagarem os direitos autorais das músicas cantadas em seus blocos.

Segundo a matéria, “o cálculo dos direitos autorais é baseado na quantidade de pessoas: R$ 4,00 por folião”. Então imaginem vocês: se o Cordão da Bola Preta levar dois milhões de pessoas ao Centro do Rio, deve pagar 8 milhões de reais ao Ecad. É sério isso? Seria o fim do mundo para os blocos.

Ouvido pela reportagem da revista, um representante do órgão disse que antes do cadastro na prefeitura eles iam atrás de um bloco sempre que sabiam de sua existência. Então agora, sabendo antes, não vão atrás para saber as músicas executadas? Ou haverá um acordo, de mentirinha ou não, sei lá, com os organizadores apresentando um repertório e pagando antes pela execução de apenas aquelas músicas listadas? E nada da massa pedir bis ou improvisos, hein? Nem pensar vestir uma camisa listrada e sair cantando o que quiser por aí!

Acho surreal - e injusto. O Ecad tem uma função vital para garantir o direito dos autores, claro, mas isso é exagero e diria até imoral. Afinal, bloco de rua não cobra ingresso. Então se eu quiser pegar minha família, vizinhos e amigos e sair pelas ruas batendo em panelas cantando marchas de carnaval, vou ter que pagar direitos ao Ecad? De acordo com os argumentos apresentados na matéria, até em festinha de aniversário corremos risco de pagar direitos autorais. Torcida cantar música no Maracanã? Não pode também. Procissão religiosa? Direito$ para os autores dos hinos.

Falta bom senso nesse esforço do Ecad. Obviamente, nenhum bloco de rua pode arcar com essa cobrança, mesmo os maiores. Então vai rolar um acordo, uma conta de chegar, que satisfaça ambas as partes. O que deixa dúvidas sobre a legitimidade da cobrança. Não falo da legitimidade legal, mas da legitimidade moral de cobrar direitos autorais em eventos que não cobrem ingressos. Isso é uma ameaça a eventos realmente populares.

Ainda na mesma matéria, o querido João Roberto Kelly defende a posição do Ecad: “Adoro os blocos de rua. Mas o trabalho do Ecad é importante porque vários compositores, como eu, vivem disso.” Só que tomo a liberdade de discordar do genial compositor de marchinhas de carnaval, pois são os blocos de rua cantando clássicos como “Cabeleira do Zezé” que eternizam compositores como ele, Lamartine Babo, Haroldo Lobo, Zé Keti e Braguinha, que desse modo têm suas músicas levadas para os bailes, shows e discos de carnaval, onde, aí assim, a cobrança de ingresso e a comercialização fazem obrigatória a contrapartida ao Ecad.

Sem os blocos de rua, talvez não lembrássemos mais de “Cabeleira do Zezé”, “Me Dá um Dinheiro Aí”, “Mulata Iê-Iê-Iê”, “Mamãe Eu Quero”, “As Águas Vão Rolar”, “O Teu Cabelo Não Nega”, “Índio Quer Apito”, “Bandeira Branca”, “Linda Lourinha”, “Linda Morena”, “Máscara Negra”, “Pastorinhas”, “Até Quarta-Feira”, “Allah-Lá-Ô”, “Cachaça”, “Chiquita Bacana”, “Marcha do Remador”, “A Jardineira”, “Pierrô Apaixonado”... São os blocos de rua que divulgam e eternizam os autores dessas marchinhas maravilhosas - e de graça! Quer forma de divulgação maior e melhor que essa? E permanente, que se repete ano após ano.

*** *** ***

Leia mais sobre carnaval e escolas de samba em OBatuque.com!